Especialistas na área de economia do esporte e profissionais ligados a confederações de esportes individuais dizem que o Brasil já "perdeu o bonde para 2016", mesmo com um aumento de benefícios a atletas e o investimento na infraestrutura de treinamento.
Na reta final de Londres 2012, o Time Brasil conquistou 17 medalhas (sendo três de ouro), superando em apenas duas a previsão do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), que esperava atingir o mesmo resultado da Olimpíada de Pequim 2008."O investimento deveria ter acontecido antes. Já deveríamos ter terminado Pequim olhando para a Olimpíada de 2016", disse à BBC Brasil Miguel Arruda, conselheiro da Confederação Brasileira de Atletismo e do clube BMF, o principal do país na modalidade.
Em Pequim 2008, o investimento governamental de cerca de R$ 1,2 bilhão culminou em 15 medalhas, duas a menos do que em Londres 2012, onde as cifras, que serão anunciadas pelo COB ainda hoje, parecem ter sido muito maiores.
Nos Jogos de Londres, a delegação brasileira manteve o bom desempenho em esportes de grupo e dupla, chegando às finais do vôlei feminino e masculino, do futebol masculino e do vôlei de praia masculino.
Com uma performance dentro do planejado no judô e surpresas positivas no boxe e na ginástica artística masculina, aumentaram a contagem de medalhas do país.
Neste domingo, o superintendente executivo do COB, Marcus Vinicius Freire, disse que atletismo e natação, que foram para menos finais em Londres, tornaram-se pontos de "atenção" e "preocupação".
Falta de renovação
O atletismo participou de somente três finais, no revezamento 4x100 metros feminino, no arremesso de peso e no salto em distância masculino, e terminou os Jogos sem medalha pela primeira vez desde 1992. Em Pequim, foram sete finais e um ouro.Segundo Arruda, o desempenho se deve à pouca quantidade de atletas de alto rendimento em condições de competir em Olimpíadas - e o quadro não deve melhorar até 2016, por causa da dificuldade de renovação da equipe brasileira.
"No atletismo é possível que tenhamos resultados piores (no Rio 2016) do que em Londres. Os atletas que vão competir no Rio já estão em competições nacionais e os resultados que estamos observando são ínfimos. Temos que tirar leite de pedra dos poucos atletas que a gente tem."
"Nosso contingente de atletas em Londres é bom, mas se você fizer um corte de idade, terá poucos deles em 2016. A performance deles já está baixa, por causa do avanço da idade. Na minha opinião, não há tempo. 2016 já passou. Já perdemos o bonde no atletismo", afirmou à BBC Brasil.
Maurren Maggi não conseguiu medalha no atletismo; país 'perdeu o bonde' na modalide
"Sou bastante cético quanto a isso. Acho que esse investimento já deveria ser feito e talvez não dê tempo para o Rio. Os centros de treinamento já deveriam estar prontos para que nossas categorias infantil e de base pudessem treinar.", disse à BBC Brasil.
"Se olharmos para o que era há dez anos, melhorou muito, mas não o suficiente para sermos uma potência. E Diego, Arthur e Sasaki são exceções e devem ser tratados como tal. São talentos acima da média e é por isso que chegaram onde chegaram, mesmo não tendo as condições necessárias."
Investimento tardio
A equipe britânica, que competiu em todas as modalidades e ganhou 65 medalhas, sendo 29 de ouro, também atribui o bom desempenho principalmente ao investimento financeiro no esporte de alto rendimento, que quadruplicou no ciclo olímpico de Atenas 2004 a Pequim 2008.Em Atlanta 1996, tanto a Grã-Bretanha quanto o Brasil tiveram 15 medalhas cada. No ciclo seguinte, quando o governo britânico passou a destinar parte dos lucros com a Loteria Nacional no esporte pela primeira vez, a delegação dobrou seu número de medalhas e conquistou 28 em Sydney.
O Brasil fez o mesmo em 2001, quando o governo sancionou a lei Agnelo Piva, destinando 2% da arrecadação da loteria para o COB e o Comitê Paralímpico.
Mas entre 2004 e 2008, o investimento do governo britânico quadruplicou e, em Pequim, o país deu um salto de 17 medalhas em relação a Atenas. Agora, com um aumento de 30 milhões de libras (cerca de R$ 95 milhões) no orçamento destinado ao esporte, os britânicos chegaram a 65 medalhas.
O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, admite que os investimentos do governo brasileiro foram tardios em relação às metas do país para 2016, quando o COB chegou a prever a conquista de 30 medalhas. Mas ele afirma que o país chegará ao resultado planejado para 2016 pela "necessidade".
Ministro do Esporte diz que Brasil terá mais medalhas em 2016 'por necessidade'
Em entrevista à BBC Brasil, Aldo Rebelo afirma que país terá mais investimento e pode alcançar meta para o Rio com "afinco".
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"Mais do que possível (chegar ao resultado previsto para 2016), é necessário. Nós precisamos melhorar o nosso desempenho pra 2016."
Após o encerramento dos Jogos de Londres, a presidente Dilma Roussef deve anunciar um "Plano Medalha", que aumentará ainda mais os recursos destinados ao esporte de alto rendimento no país.
O programa deverá ter como foco modalidades os esportes individuais, que distribuem mais medalhas e são o "ponto fraco" do time Brasil. Segundo Rebelo, outro programa, chamado até agora de "Bolsa-Técnico" destinará recursos para a equipe de especialistas que acompanha os atletas.
Aldo Rebelo diz que o foco no aumento do número de medalhas acontece, além da pressão do país-sede, por causa do efeito "pedagógico" sobre as novas gerações.
"O bom desempenho no esporte de alto rendimento cria uma cultura, tem um efeito pedagógico e educativo sobre as crianças e sobre os jovens. Essas referências estimulam a prática nao só do esporte de alto rendimento, mas da atividade física, do esporte de lazer."
Esporte de base
De acordo com o ministério do Esporte, a prioridade do atendimento do Bolsa-Atleta são os atletas olímpicos e paralímpicos. Em 2012, o benefício passou a contemplar também os atletas já consagrados, independentemente de terem outros patrocínios.Atualmente, 42% dos atletas olímpicos e 85% dos paralímpicos de alto rendimento que já obtêm bons resultados em competições nacionais e internacionais de sua modalidade recebem a bolsa.
"É um erro pensarmos que vamos colocar dinheiro em quatro anos e vamos criar muitos atletas. Um atleta não se forma da noite para o dia."
Paulo Montagnet, coordenador do Grupo de Estudos Avançados em Esporte, da Unicamp
"Não há condição biológica de formar um atleta num espaço menor do que 10 anos. É o tempo que a estrutura física demora para se adaptar às cargas dos treinamentos. Nos esportes coletivos é um pouco diferente, mas os esportes individuais demandam mais da capacidade física, isso é determinante", diz Miguel Arruda.
Paulo Montagner, coordenador do Grupo de Estudos Avançados em Esporte da Unicamp, afirma que o investimento do Brasil no alto rendimento é de ordem parecida ao de outros países, mas critica o que considera o pouco esforço para criar uma estrutura de esporte escolar, que possa revelar novos atletas.
"A discussão mais errada que podemos ter é querer fazer com dinheiro público mais medalhas em 2016. Financiamentos esportivos em um país saudável devem passar por políticas de longo prazo. É um erro pensarmos que vamos colocar dinheiro em quatro anos e vamos criar muitos atletas. Um atleta não se forma da noite para o dia", disse à BBC Brasil.
"O país tem que investir em esporte de rendimento, sim. Porque é bonito, é motivador. Mas é preciso proporcionar esporte. O que adianta agora as crianças quererem fazer ginástica artística e não terem onde fazer? Esse é o papel do Estado."
O COB recebe 85% dos recursos da Loteria Nacional. Desse total, 10% vão para o esporte escolar e 5%, ao universitário, segundo dados do Ministério do Esporte. "Em relação à necessidade, é pouco, mas em relação ao que tínhamos, é muito", disse Aldo Rebelo.
nada mal
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