Reportagem de VEJA desta semana explica a popularidade do marido traído e bovinamente passivo de 'Avenida Brasil' - e que virou esteio moral da nação
Marcelo Marthe
ELE TARDA, MAS NÃO FALHA - O bate-boca em que Tufão (Murilo Benício) finalmente desmascarou Carminha (Adriana Esteves): "Me conta uma história para eu não te matar, sua vadia" (Divulgação/TV Globo)
"Por demorar tanto a descobrir as coisas, o Tufão tinha tudo para ser um sujeito irritante. Não foi uma peça simples de ajustar dentro da trama", diz o noveleiro João Emanuel Carneiro. Mas o autor recorreu a uma boa fonte: buscou na literatura o pai de todos os Tufões. Trata-se do príncipe Michkin, protagonista do romance O Idiota, do russo Fiodor Dostoievski (1821-1881). A semelhança entre os personagens, aliás, foi escancarada em uma daquelas indiretas absolutamente diretas dadas pela heroína Nina/Rita (Débora Falabella) por meio de suas sugestões de leitura ao patrão. O personagem é um jovem dotado de uma bondade sem tamanho. Revela-se tão superior em sua pureza que as pessoas corrompidas e pavorosas que o cercam o julgam um desajustado.
Ao transportar O Idiota para o subúrbio do Divino, Carneiro criou - Carminha que não nos ouça - o personagem que resume o espírito da novela. "Ele não tem as atitudes de um herói. Carece de iniciativa e fica a reboque dos outros", afirma o autor. Ele usou certos truques para evitar que Tufão não fosse visto como um paspalho pela audiência. O personagem exercita o que o noveleiro chama de "amor de renúncia": ama mais a família que a si próprio. "Essa coisa toca demais a alma do brasileiro", diz. Bem ou mal, Tufão também nunca deixou de buscar a verdade. Por fim, um dado essencial: apesar de ele levar um golpe de Carminha, sua vida de alcova com a vilã, até onde se saiba, era satisfatória. "Ser enganado, tudo bem. Mas, se ele não fosse para a cama com ninguém, o espectador iria achá-lo um completo banana", diz Carneiro. Amor de verdade, no entanto, Tufão só iria fazer neste fim de semana, ao deitar e rolar com sua antiga amada, a cabeleireira Monalisa (Heloísa Perissé). Por fim, como ensina a psicologia evolutiva, a fantasia das mulheres é atiçada pela grandeza de Tufão em assumir a prole alheia.
É óbvio que Murilo Benício teve parte fundamental em conferir credibilidade a esse homem bom tão difícil de encontrar nas novelas. O ator fluminense de 41 anos emprestou a Tufão tiques que, aparentemente, comunga com ele - como o hábito de coçar a nuca. Em uma entrevista, Benício já contou que aquele jeito de olhar por baixo foi surripiado de um personagem vivido no cinema pelo americano Robert De Niro. Com seu abdômen meio fora de forma, o ator dota Tufão, ainda, de uma semelhança providencial com os heterossexuais de verdade disponíveis no mercado - e, como sabe qualquer mulher que já tenha vivido um bocadinho a vida, muito mais vale uma barriga afetuosa que um tanquinho indiferente.
Para tentar manter segredo sobre o final de Avenida Brasil, no dia 19, Carneiro preparou cinco versões do desfecho - apenas uma, claro, é a que vale. Não se sabe o que vai ser de Carminha. "Só posso adiantar que ela terá um fim nada convencional", diz. Ele declara, contudo, que em dado momento Carminha vai implorar para ter Tufão de volta. Em vão. Ele pode ser um macho meio bovino. Mas não é nenhum burro.
eu odeio novela!
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