Cármen Lúcia suspende parcialmente indulto assinado por Temer
Alegando violação de
vários princípios da Constituição, Raquel Dodge já havia afirmado que o
decreto coloca em risco a Operação Lava Jato.A ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)
suspendeu nesta quinta-feira, 28, parcialmente o decreto de indulto
assinado pelo presidente Michel Temer na semana passada. A decisão é uma
resposta a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizada pela
procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
"Defiro a medida
cautelar (art. 10 da Lei n. 9.868/1999), para suspender os efeitos do
inc. I do art. 1º; do inc. I do § 1º do art. 2º, e dos arts. 8º, 10 e 11
do Decreto n. 9.246, de 21.12.2017, até o competente exame a ser levado
a efeito pelo Relator, Ministro Roberto Barroso ou pelo Plenário deste
Supremo Tribunal, na forma da legislação vigente", diz Cármen na
decisão.
Alegando violação de vários princípios da Constituição,
Raquel afirmou que o decreto coloca em risco a Operação Lava Jato,
"materializa o comportamento de que o crime compensa" e "extrapolou os
limites da política criminal a que se destina para favorecer,
claramente, a impunidade".
Raquel também havia solicitado que a
presidente da Corte concedesse "com a maior brevidade possível, em
decisão monocrática e sem intimação dos interessados, medida cautelar
para suspender a eficácia das normas impugnadas, em razão da urgência do
caso’."O indulto remonta ao período do absolutismo monárquico, em que não
havia separação dos poderes ou mesmo o sistema de freios e contrapesos
adotado na Constituição brasileira, a partir da teoria de Montesquieu. O
direito penal era aplicado de forma arbitrária e violenta e, assim, o
instituto representava um ato de clemência do monarca, que concentrava
funções legislativas, judiciais e executivas", afirmou a procuradora.
O
indulto, publicado na sexta-feira, 22, consiste em um perdão de pena e
costuma ser concedido todos os anos próximo ao Natal. No do ano passado,
foram beneficiadas pessoas condenadas a no máximo 12 anos e que
tivessem cumprido um quarto da pena, desde que não fossem reincidentes.
No indulto deste ano, não foi estabelecido um período máximo de
condenação e o tempo de cumprimento da pena foi reduzido de um quarto
para um quinto no caso dos não reincidentes.
No pedido ajuizado
no Supremo, Raquel alegava que o decreto - apesar de ser uma
prerrogativa do presidente -, da forma como foi feito, invade a
competência do Congresso de legislar sobre o direito penal e esvazia a
função da Justiça.
Segundo a procuradora, a determinação "sem
razão específica" ampliou os benefícios desproporcionalmente e "criou um
cenário de impunidade no País: reduziu o tempo de cumprimento de pena
que ignora a pena aplicada; extinguiu as multas aplicadas; extinguiu o
dever de reparar o dano; extinguiu penas restritivas de direito, sem
razões humanitárias que justifiquem tais medidas e tamanha extinção da
punibilidade".
Raquel destacou ainda que o decreto veio no
contexto do avanço da Lava Jato, "após a punição dos infratores,
corruptos e corruptores, por sentença criminal".
Ao criticar a
redução do tempo mínimo de um quarto para um quinto da pena - no caso de
não reincidentes nos crimes sem violação, como os casos de corrupção - a
procuradora citou, como exemplo, que uma pessoa condenada a 8 anos e 1
mês de prisão não ficaria nem sequer um ano preso.
'Generoso'
Raquel
diz na ação que o que se extrai da determinação, classificada "como
"indulto mais generoso", em uma escala ascendente de generosidade que
marca os decretos de indulto nas duas últimas décadas - é que será causa
única e precípua de impunidade de crimes graves, como aqueles apurados
no âmbito da Operação Lava Jato e de outras operações contra a corrupção
sistêmica".
O decreto ignorou solicitação da força-tarefa e
recomendação das câmaras criminais do MPF que pediam, entre outros
pontos, que os condenados por crimes contra a administração pública -
como corrupção - não fossem agraciados pelo indulto. Na ação, Raquel
relembra essa manifestação.
A procuradora-geral salientou que
presidentes da República não têm poder ilimitado de conceder indulto.
"Na República, nenhum poder é ilimitado. Se o tivesse, aniquilaria as
condenações criminais, subordinaria o Poder Judiciário, restabeleceria o
arbítrio e extinguiria os mais basilares princípios que constituem a
República constitucional brasileira."O decreto foi criticado por procuradores e representantes da Lava Jato.
Em novembro, os integrantes da força-tarefa em Curitiba estimaram que ao
menos 37 condenados pelo juiz federal Sérgio Moro poderiam ser
beneficiados pelo indulto.
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