Madrugada foi de tensão na favela Pavão-Pavãozinho, na zona sul do Rio de Janeiro, e um homem morreu após tiroteio.
Após um longo tiroteio pela madrugada na favela
do Pavão-Pavãozinho, em Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro, o
comércio local amanheceu com as portas fechadas nesta quinta-feira.
Thomas Rodrigues Martins, 32 anos, morreu após ser atingido por tiros de
fuzil, durante uma intervenção policial, conforme informou a Polícia
Civil do Estado. Esta é uma velha prática dos tempos em que o tráfico
de drogas controlava as comunidades do Rio de Janeiro, com a fundamental
diferença de que, nos tempos atuais, já existem as Unidades de Polícia
Pacificadora (UPPs).
A morte de Martins, cujo corpo se encontra agora no Instituto Médico Legal (IML), motivou um protesto
de moradores do morro. Durante o cortejo de seu corpo, os manifestantes
fecharam o cruzamento da rua Sá Ferreira com a avenida Nossa Senhora de
Copacabana, principal acesso ao morro. Martins tinha passagens na
polícia por roubo, tráfico de drogas e porte ilegal de arma de fogo. O
caso está sendo investigado pela 13ª DP (Gávea). Quatro policiais foram
ouvidos e tiveram os fuzis apreendidos para confronto balístico.
Testemunhas e moradores serão chamados para prestar depoimento.
O clima foi de revolta entre moradores, que rechaçam a
participação de Martins com o tráfico de drogas, mas, de acordo com
moradores ouvidos pelo Terra, a presença do tráfico aumenta cada vez mais no local, ocupado por uma UPP desde 2009.
"O tráfico tem uma hierarquia, e quando acontecem essas
coisas, eles mandam fechar o comércio. Tinha acabado isso, mas teve essa
ordem. A UPP deu garantia, mas os moradores ficam tensos, não tem
jeito", explicou o presidente da associação de moradores do morro do
Cantagalo, vizinho ao Pavão-Pavãozinho, Luiz Bezerra do Nascimento.
Por mais que sejam duas comunidades distintas, elas
ocupam praticamente o mesmo plano, com a diferença de que o Cantagalo é
acessado pelo bairro de Ipanema, enquanto que no caso do Pavão, por
Copacabana. Ou seja, a situação de ambas, em termo de presença do
tráfico e políticas de segurança pública, é a mesma. "Ele (Martins) era uma pessoa nascida e criada na comunidade. Isso ajudou o clima a ficar ainda mais pesado", completou.
De acordo com Bezerra, "antes os policiais da UPP nem
usavam fuzil. Mas como voltaram a andar essas pessoas armadas, já tem um
tempo que as patrulhas voltaram a andar mais com fuzil pela
comunidade". Este fato, inclusive, gerou um erro de informação por parte
da assessoria de imprensa das Unidades de Polícia Pacificadora, que,
num primeiro momento, afirmou que a morte do morador, atingido por balas
deste calibre, não era oriunda de disparos feitos por policiais
justamente em função dos PMs locais não portarem fuzis.
A Polícia Civil desmentiu, posteriormente, a notícia
corroborando com a tese de que ele foi morto após intervenção policial.
"O que a gente escuta por aí é que eles estão tentando retomar tudo. Já
se vê gente andando armada, principalmente pela noite. O clima é de
medo, claro, pois a gente estava muito mais tranquilo antes. Agora vive
tenso", relatou uma moradora, que pediu para não ter a identidade
divulgada.
Moradora há 30 anos do Pavão-Pavãozinho, ela reafirma
que o comércio fechado foi ordem de traficantes que ainda atuam no local
- o marido dela possui um bar na localidade e recebeu ordem expressa de
marginais para não levantar as portas. "Estamos com muito receio. Os
policiais dizem para abrirmos, ficarmos tranquilos, mas como, se voltou a
ter gente morrendo?", perguntou.
Uma outra moradora da comunidade, há 15 anos no local, relatou ao Terra
que escutou um intenso tiroteio pela madrugada - "coisa que há tempos
não acontecia, parecia os tempos antes da UPP mesmo" -, e que não mais
conseguiu dormir, principalmente após os rasantes do helicóptero da Polícia Militar
sobre a comunidade. "Parecia uma operação. Foi o nosso pior momento
desde que colocaram a UPP aqui, sem sobra de dúvidas", disse.
O tiroteio e morte na comunidade do Pavão-Pavãozinho (a
Polícia Civil ainda averigua se um outro homem foi ou não ferido no
tiroteio) foi o terceiro episódio recente de violência ocorrido em favelas
com UPPs no Rio de Janeiro. Na última quinta-feira, moradores de
Manguinhos, onde recentemente foi instalada uma UPP, protestaram contra a
morte de um jovem de 18 anos. Um dia depois, dois PMs de uma UPP
instalada no Complexo do Alemão foram baleados após troca de tiros com
possíveis criminosos relacionados ao tráfico de drogas local.
De acordo com a especialista em segurança pública e
chefe do Instituto de Estudos Sociais e Polícitos (Iesp) da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Alba Zaluar, "é óbvio que os
traficantes nunca se conformaram com essa política de segurança. Eles agora estão em 'bequinhos', com limites impostos pela presença de policiais, e com ganhos muito menores".
Na opinião da especialista, as recentes manifestações,
com o emprego de força policial ostensiva na tentativa de conter
manifestantes mascarados mais exaltados, "foi uma oportunidade para que o
tráfico aumentasse sua investida. Os policiais estão exaustos, a
corporação está exausta. Esta garotada mais violenta está abrindo
caminho para eles de uma certa forma", concluiu.
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