quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Relações entre Brasil e Argentina exigem maior colaboração

As restrições comerciais impostas pelo governo Kirchner desagradaram o segmento exportador brasileiro e o próprio empresariado argentino
Foto: Shutterstock
Recentemente, a relação entre Brasil e Argentina aparentou se desenrolar de forma a estender a histórica rivalidade nos campos de futebol também ao âmbito econômico. As restrições impostas pelo governo argentino às importações, medida que visa a manutenção de uma balança comercial favorável no país, repercutiu fortemente nos vizinhos brasileiros e a previsão dos especialistas é de que o cenário instalado deve se estender pelos próximos meses. Por ora, a saída pode ser encontrar novas áreas onde a parceria seja vantajosa para ambos os países para, a longo prazo, intensificar o diálogo e promover ações comuns de colaboração política e econômica. Nada disso permeado por rixas culturais: segundo o economista argentino Andrés Musacchio, o problema dos hermanos não é o Brasil, mas o contexto de sua própria política interna.

Musacchio, que é professor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Buenos Aires, esteve no Brasil em agosto apresentando a palestra "Brasil e Argentina: Conflito e Negociação", integrante do ciclo de debates da Fundação de Economia e Estatística (FEE). O economista esclarece que, historicamente, a relação entre os dois países é marcada por um processo de permanente aproximação, no qual as disputas comerciais tendem a ser orientadas pela lógica do acordo. Porém, a parceria está enfrentando uma fase turbulenta devido ao interesse de ambos os países em defender o setor externo em meio à crise internacional ‒ no caso da Argentina, que há anos enfrenta a fuga massiva de capital estrangeiro, por meio da adoção de fortes políticas de defesa do superávit comercial e substituição das importações. "Geralmente quando se desequilibra o comércio entre os dois países, é porque um está crescendo mais rápido e importando mais que o outro", observa Musacchio.

As barreiras comerciais decorrentes dessas medidas afetaram tanto as receitas do segmento exportador do Brasil, importante fornecedor de produtos como calçados, linha branca e itens automotores, quanto o próprio empresariado argentino, que sofre também com taxas de câmbio reguladas a partir dos índices oficiais de inflação, em torno de 10%; os especialistas estimam que o percentual verdadeiro se encontra por volta de 25%. "Nos próximos anos, as restrições vão seguir afetando os dois países", projeta o economista argentino. "Em uma perspectiva de mais longo prazo, a relação entre eles teria de começar a focar em outros aspectos nos quais há muito terreno para o trabalho em conjunto", opina. Para Musacchio, o momento expressa a necessidade de implementação de uma nova política que aborde temas estruturais na Argentina - como tecnologia, energia, infraestrutura e combate à pobreza - e deveria impulsionar o estreitamento das relações com o Brasil nesses setores, que são chave para o desenvolvimento dos dois países.

Cooperação briga com a concorrência
Outro ponto destacado pelos especialistas é a necessidade de integração regional baseado na complementaridade econômica. O cientista político Christian Lohbauer, membro do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional (GACInt) da USP, explica que Brasil e Argentina são concorrentes em diversas cadeias produtivas, o que gera disputas comerciais que entravam a parceria especialmente pelo fato do Brasil ser um país maior e, em média, mais competitivo. "Ninguém pode ser contra uma integração regional porque o mundo inteiro está praticando isso. Deve ser feito um programa de desenvolvimento onde os dois lados entendam que vão ter perdas", afirma.

Renato Baumann, técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e professor de economia internacional da Universidade de Brasília (UnB), concorda. "Hoje nós enfrentamos a concorrência de produtos asiáticos que são fabricados precisamente a partir de um modelo de complementaridade produtiva, que tem custos mais baixos. Nunca tivemos nada parecido na América Latina e nem há sinais fortes e decididos de que é por aí que vamos", comenta. O economista acrescenta que, além do ganho com a ampliação do mercado e a redução das despesas, a medida promoveria o aumento no grau de interrelação do empresariado argentino e brasileiro, aproximação que favoreceria a conciliação dos aspectos políticos e comerciais.

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