Cautelosos,
hesitantes e em descompasso com os senadores, os deputados americanos
já sinalizam a possibilidade de aprovar a legalização de jovens que
entraram nos EUA trazidos pelos seus pais, os chamados dreamers ("sonhadores", em tradução livre).
A medida de caráter limitado ainda não ganhou
roupagem legislativa, mas já suscitou reações contraditórias porque, no
contexto de uma reforma migratória, contrasta com o projeto de lei do
Senado que abriria o caminho para a legalização de todos os 11 milhões
de imigrantes indocumentados nos EUA.O tema voltou à Comissão de Justiça da Câmara de Representantes na terça-feira em uma audiência presenciada por cerca de 40 dreamers. Para alguns analistas, a simples discussão representa uma abertura para tratar dessa matéria na Câmara.
Mas entidades pró-imigração e fontes do governo criticaram o que entendem ser uma tentativa de republicanos de minar uma promessa de campanha do presidente Barack Obama.
"Queremos (a legalização de) 11 milhões e qualquer coisa menos que isso é inaceitável", expressou a ONG United We Dream, para quem "uma verdadeira reforma de imigração" não pode deixar de lado a totalidade de ilegais que vivem nos EUA.
Já o assessor da Casa Branca Dan Pfeiffer acusou os deputados republicanos de "cruel hipocrisia" ao sugerir legalizar "alguns jovens" e deportar os seus pais.
Perdão limitado
Cerca de 2 milhões de jovens entraram nos EUA antes dos 16 anos de idade trazidos pelos seus pais, estimam analistas.A possibilidade de legalizar este contingente já foi discutida no Congresso no contexto do chamado Dream Act em 2010. A proposta foi bloqueada por republicanos.
Agora, uma nova lei sobre o assunto – Kids Act – está sendo concebida pelos deputados republicanos Bob Goodlatte, presidente da Comissão de Justiça, e Eric Cantor, líder da maioria na Câmara. Ambos votaram contra o Dream Act em 2010.
Os parlamentares não deram detalhes do projeto nem disseram se pretendem apresentá-lo antes do recesso parlamentar de agosto, dentro de pouco mais de uma semana.
Desde que a reforma migratória foi aprovada no Senado no início deste mês, todas as atenções passaram à Câmara. Mas a energia da tramitação foi logo cortada pelo presidente da Casa, o republicano John Boehner, que disse que só levará a votação um projeto que conte com o apoio da sua bancada.
A maioria republicana na Câmara é contra um projeto que seu eleitorado possa interpretar como uma "anistia" para milhões de indivíduos que desrespeitaram as leis americanas.
Mas a legalização de indocumentados que entraram nos EUA quando crianças é uma das concessões com que os republicanos concordam.
Lentidão
John Boehner já havia indicado que a Câmara quer aprovar o seu próprio texto, e não simplesmente votar o do Senado. Isto quer dizer que a redação final só sairia após a harmonização das propostas das duas Casas.E este não seria o único obstáculo à tramitação. Os republicanos, que são maioria entre os deputados, têm indicado sua preferência por votar a reforma migratória em partes, e não como um todo, como ocorreu no Senado. A proposta do Senado foi aprovada com apoio bipartidário.
Na terça-feira, o líder da maioria democrata no Senado, Harry Reid, indicou que os senadores não aceitarão esta estratégia. "Precisamos de uma reforma abrangente", disse o senador. "Não vamos analisar um pedaço aqui e outro ali. As partes formam um todo."
Para completar, alguns analistas creem que a reforma migratória só voltará à pauta legislativa da Câmara no outono americano, após o recesso, quando os parlamentares estarão mais ocupados com questões relativas ao orçamento do próximo ano.
Na tentativa de apressar a reforma, organizações conservadoras com influência sobre a base republicana buscam convencer os deputados a dar prioridade e abrangência ao tema. Entre elas estão organizações religiosas (para quem muitos imigrantes ilegais são fonte de fiéis) e empresariais (que precisam da mão-de-obra imigrante).
"Cada dia que passa é uma oportunidade perdida para consertar nosso sistema migratório segundo valores bíblicos", disse a organização religiosa Evangelical Immigration Table. A entidade fará nesta quarta-feira uma "oração" pela aprovação da lei de imigração.
"A Câmara deve avançar e não criar uma segunda classe permanente de cidadãos composta por milhões de pessoas. Não queremos nem anistia nem tratamento especial, mas um processo através do qual os que aspiram a ser americanos possam vir a contribuir plenamente para o nosso país como cidadãos."
Além disso, muitos políticos republicanos, como o senador John McCain, enfatizam que o partido precisa reconstruir as suas relações com o eleitorado hispânico, que nas eleições do ano passado foi decisivo para reconduzir Barack Obama à Casa Branca.
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