A família do vigilante Nelson Santos, 48 anos, disse nesta
segunda-feira que ele foi vítima de discriminação social e racial ao ter
o atendimento negado em um hospital particular de Itaquera, zona leste
de São Paulo, na noite da última quarta-feira. Santos morreu depois de
passar mal e ser levado ao hospital pelo motorista e o cobrador de uma
lotação na qual seguia para o trabalho. Em entrevista coletiva,
familiares classificaram o caso como “uma sentença de morte”.
As
imagens do vigilante, negro, agonizando e se contorcendo de dor em
frente ao hospital Santo Expedito, em Itaquera, foram parar na internet,
onde repercutiram porque denotaram suposta omissão de socorro por parte
de médicos e enfermeiros da instituição.
O caso é investigado
pelo 53º DP (Parque do Carmo), onde familiares já prestaram
depoimento. Testemunhas disseram à polícia que funcionários do hospital
teriam se recusado a atender o paciente, já que ele não tinha convênio
médico. Na entrevista de hoje, representantes da família e o advogado
constituído para o caso, Ademar Gomes, disseram que vão acionar
diretores e funcionários do hospital na justiça criminal e cível, na
qual deverão requerer uma indenização por danos morais e materiais no
valor de aproximadamente R$ 1,5 milhão, mais o pagamento de pensão a
oito dependentes do vigilante – os filhos de 14, 12 e 10 anos, a mulher,
uma enteada, uma irmã com problemas de saúde e as duas filhas dela.
"Foi puro descaso de classe social"
A
defesa ainda vai protocolar uma representação acusando médicos de
omissão de socorro, nos próximos dias, no Conselho Regional de Medicina
(CRM).
“O que houve foi a discriminação de um trabalhador, uma
pessoa do povo, porque ali só atenderiam convênio e particular. Olharam
para ele agonizando por 50 minutos, e, alegando que ele estava bêbado, (não o atenderam) por
pura discriminação, puro descaso de classe social, racial, todo tipo de
discriminação com quem mora na periferia e não tem recursos necessários
para ser atendido”, disse o cunhado da vítima, o metroviário Delcídio
de Souza, 57 anos.
Segundo o cunhado do vigilante, o sentimento da família é de “tristeza e muita revolta”. “O momento de contar isso (a morte do pai delas) para
as crianças foi terrível, com um tentando consolar o outro. Não
merecíamos”, disse. Sobre o porquê de Santos ter sido levado a um
hospital privado, já que não possuía convênio, atestou: “Não escolhemos
onde ter o mal súbito”.
De acordo com o metroviário e a mulher, a
cabeleireira Roseli Ribeiro dos Santos de Souza, 41 anos, irmã da mulher
do vigilante, o laudo preliminar do instituto Médico Legal (IML)
apontou como causa da morte embolia pulmonar. Eles negaram que, em algum
momento, Santos tenha apresentado problemas graves de saúde que
justificassem o mal estar de quarta-feira. Como vigilante contratado e
com bicos, o salário mensal de Santos informado pela família foi de R$
2,7 mil.
“O processo será contra o hospital, na esfera cível, e,
na cível e na criminal, contra os responsáveis por ele e o enfermeiro
que teria negado atendimento. No CRM, faremos todos os esforços para que
sejam tomadas providências contra essa omissão de socorro”, declarou o
advogado da família, Ademar Gomes. “As imagens filmadas pelas pessoas
que estavam lá mostraram que houve a falta de interesse em salvar uma
vida, e isso é crime”, completou Gomes, para quem a pensão a ser
arbitrada pela Justiça, em caso de condenação, deverá contemplar os
dependentes e, no caso dos menores de 18 anos, até que completem 24
anos.
Hospital abre sindicância e promete punição
Em
nota, o hospital Santo Expedito informou que instaurou uma sindicância
para apurar o caso e que, se apurada a responsabilidade de algum
funcionário na situação envolvendo o vigilante, “não hesitará em punir
com rigor os eventuais envolvidos”.
Por outro lado, o hospital
também afirmou não corroborar com “qualquer tipo de omissão de seus
profissionais” e salientou que “nunca se furtou em atender vítimas de
acidente de trânsito, pessoas baleadas, pessoas em processo de infarto
agudo do miocárdio e com acidente vascular cerebral, entre outras
ocorrências, mesmo que desprovidas de convênio de assistência médica”.
Também
na nota, o hospital acusou o condutor da lotação de ter agido
“irresponsavelmente” ao deixá-lo lá, e não em um pronto-socorro.
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