sábado, 26 de outubro de 2013

Como os líderes mundiais lidam com o temor da espionagem?

Angela Merkel, chanceler alemã. Foto: AP
Angela Merkel usa tanto seu aparelho que é conhecida como 'chanceler do celular'
A reação mais comum à notícia de que a chanceler alemã, Angela Merkel, teve seu telefone grampeado pela agência americana de segurança NSA é a de resignação.
Muitos vão além e dizem que a experiente e importante líder deveria ter tomado melhores precauções contra espionagem.
Para o ex-embaixador americano na Otan, Kurt Volker, "todos os países praticam espionagem", e ele não entende como as pessoas podem ter ficado surpresas com as revelações desta semana.
Já Alan West, que foi ministro da Segurança no governo do ex-premiê britânico Gordon Brown, afirma que "sempre trabalhou presumindo" que suas ligações telefônicas estavam sendo ouvidas por outras pessoas.
"Eu tenho certeza de que estavam [ouvindo minhas conversas]", disse ele à BBC. "Eu não acho que seja surpreendente que alguém tente ouvir as ligações. Se você é chefe de Estado, há muitas pessoas, não só Estados, escutando."
"Há empresas e todos os tipos de pessoas que querem ouvir o que você está falando, e eu acho que é preciso ser extremamente cauteloso."
Um ex-diplomata britânico, que não quis revelar seu nome, disse à BBC que também sempre se comportou ao telefone como se algum intruso estivesse escutando sua conversa.
Isso, em algumas ocasiões, era até uma vantagem para ele, já que podia tentar influenciar – através de seu comportamento ao telefone – as pessoas que ele especulava que estariam o escutando.
Mas ele ressalta que, ao ler relatórios sobre pessoas cujas ligações eram monitoradas pelo seu órgão, também precisava levar em consideração que elas estavam jogando o mesmo jogo.
O ex-ministro do Interior britânico David Blunkett disse recentemente que Nicolas Sarkozy – na época em que o francês foi ministro do Interior de seu país – tentou poupar tempo em uma negociação bilateral ao revelar que já conhecia a posição britânica, pois seu serviço secreto havia interceptado e-mails.
Mas nem todos são tão indiscretos.
Clare Short, que atraiu a fúria do governo britânico em 2004 ao revelar que as autoridades tinham grampeado o telefone do então secretário geral da ONU, Kofi Annan, disse que estava "chocada" com as revelações sobre Angela Merkel.
Short, que foi ministra britânica do Desenvolvimento Internacional, não acredita que Merkel está manifestando indignação apenas para ganhar apoio do povo alemão – muitos deles ainda perturbados com memórias da polícia secreta Stasi, da Alemanha Oriental.
Nicolas Sarkozy. Foto: Getty
Nicolas Sarkozy teria revelado em reunião com britânicos conteúdo de conversa interceptada
"Eu tenho certeza de que ela está muito irada e triste. Eles eram todos amigos, mas agora [ela sente] que eles não confiam mais nela", diz Short.

Blair e o celular

A política diz que recebia com frequência relatórios sobre conversas privadas de Annan, e que isso começou a incomodá-la bastante com a proximidade da guerra do Iraque.
Ela lembra da experiência surreal de conversar com Annan pelo telefone, sabendo que alguma pessoa estava transcrevendo tudo que era dito pelos dois.
Entre 1997 e 2003, quando esteve no gabinete do então premiê britânico Tony Blair, ela diz não ter recebido relatórios sobre o que os líderes de outras potências aliadas à Grã-Bretanha estavam falando.
Mas ela diz ter sido abordada por vários diretores do MI6 – a agência britânica de inteligência – oferecendo serviços para espionar líderes de países africanos, muitos deles aliados dos britânicos.
"Eu disse 'é claro que não, nós não queremos espionar as pessoas com as quais trabalhamos'", diz ela à BBC.
Ela também desmente um boato comum sobre Tony Blair, de que o ex-premiê nunca usou telefones celulares quando esteve no cargo. Para ela, isso pode ter sido um boato espalhado pelo próprio governo.
"Faz ele parecer mais um imperador", diz ela.
Todos os chefes de Estado, pelo menos no mundo ocidental, têm acesso a telefones celulares com códigos cifrados e outras formas seguras de comunicação.

'Bolha da Casa Branca'

O problema colocado diante dos agentes de segurança é conseguir convencer seus chefes sobre os perigos da espionagem.
Pouco depois de chegar ao poder em 2008, o presidente americano, Barack Obama, conseguiu convencer seu serviço secreto a deixá-lo portar seu próprio Blackberry, apesar de que temores de que o aparelho revelaria seu paradeiro, o expondo a ataques virtuais.
Obama teria ficado frustrado com a necessidade de viver dentro da "bolha da Casa Branca", com sua comunicação com o resto do mundo interrompida, e sem acesso a pessoas normais.
O Blackberry do presidente aparece em algumas fotografias, revelando que ele ainda possui um pequeno grau de liberdade para usá-lo.
Na França, políticos do primeiro escalão possuem uma intranet e uma rede de telefones seguras – mas muitos relutam em usar o sistema, por ser lento demais.
O presidente francês, François Hollande, teria conseguido manter o "direito" conquistado por seu antecessor, Nicolas Sarkozy, de portar o próprio aparelho celular.
Em 10 Downing Street – sede do Executivo britânico, em Londres – é proibido entrar com telefones celulares, que são confiscados na entrada.
Todas as ligações que chegam ao prédio passam por um sistema seguro de telefones.
O governo britânico segue evitando parecer alarmado demais com o escândalo de espionagem.
Perguntado sobre se o premiê David Cameron ainda usa seu telefone celular, o porta-voz oficial disse: "Não o vi usando qualquer outro aparelho até agora".

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