quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Grupos pró-Rússia e pró-Kiev se enfrentam no sul da Ucrânia

Manifestantes na Crimeia (Reuters)
Após a mudança de governo, rumores sobre a separação da Crimeia ganharam força
Grupos de manifestantes pró-Kiev e pró-Moscou entraram em confronto na frente do parlamento de Simferopol, capital administrativa da Crimeia, no sul da Ucrânia, em uma escalada da tensão gerada pela deposição do presidente Viktor Yanukovych na semana passada.
Milhares de pessoas foram para a frente do edifício por conta de rumores que a separação da região seria discutida na sessão desta terça-feira.
Apenas um cordão formado por policiais separava os dois grupos, um a favor da Rússia e o outro formado por tártaros da Crimeia (grupo étnico turco que vive na região) e pessoas que apoiam a mudança de governo em Kiev.
Manifestantes contrários à Rússia chegaram a invadir o parlamento. Uma pessoa morreu, provavelmente por causa de um ataque cardíaco, durante o embate.
Um novo governo de união nacional deve ser anunciado nas próximas horas. A expectativa é a de que sejam oferecidos cargos em ministérios aos ativistas do principal acampamento dos protestos em Kiev, o Maidan.
De acordo com o enviado da BBC à Kiev, David Stern, seja qual for a formação do novo gabinete, seus membros enfrentarão uma série de desafios, como a necessidade de reformar diversas áreas do governo.
Em um outro desdobramento da crise, as autoridades que comandam o país interinamente dissolveram as unidades de polícia de elite, que são consideradas responsáveis pela morte de dezenas de manifestantes na capital ucraniana na semana passada.

Provocação

Milhares de pessoas se envolveram nos embates em Simferopol, que ocorreram antes de uma sessão do parlamento na qual a situação da Crimeia seria discutida.
No entanto, o presidente do parlamento, Volodymir Konstantinov, disse depois que uma separação da Crimeia, que hoje tem autonomia em relação à Ucrânia, não seria discutida na sessão.
Em Simferopol, tártaros da Crimeia entoavam "Glória à Ucrânia!" enquanto os manifestantes pró-Moscou respondiam gritando "Rússia!".
O corpo de um idoso foi encontrado em meio ao confronto, segundo o ministro da Saúde da Crimeia em um comunicado. Como o homem não identificado não tinha sinais de ferimentos, acredita-se que ele tenha morrido de ataque cardíaco.
A Crimeia, onde grupos étnicos russos são maioria, foi transferida da Rússia para a Ucrânia em 1954.
Membros de grupos étnicos ucranianos leais a Kiev e tártaros muçulmanos, cuja animosidade em relação à Rússia vem desde as deportações promovidas por Stálin durante a Segunda Guerra Mundial, formaram uma aliança para se opor a qualquer movimento de retorno a Moscou.
Frota russa na Crimeia (BBC)
A Rússia mantém bases navais na Crimeia; Seu futuro é incerto
A mudança de governo em Kiev levantou questões sobre o futuro de bases navais russas em Sevastopol, uma cidade portuária também na Crimea, que tiveram seu arrendamento à Rússia estendido até 2042 pelo ex-presidente.
A maioria dos especialistas acredita que a nova liderança do país não forçará a retirada da frota russa, porque isso poderia ameaçar ainda mais a estabilidade interna da Ucrânia, assim como a já frágil relação do país com Moscou, afirma o jornalista Ilya Abishev, da BBC.
Em um comunicado publicado na última quarta-feira, três ex-presidentes ucranianos - Leonid Kravchuk, Leonid Kuchma e Viktor Yushchenko - condenaram o que consideram ser uma interferência russa na política da Crimeia.

Séria ameaça

Também na quarta-feira, o presidente russo ordenou que suas tropas nas áreas central e oriental do país, próximas da fronteira da Ucrânia, fizessem treinamentos para testar se estão prontas para o combate.

Crimeia

  • República autônoma dentro da Ucrânia
  • Transferida pela Rússia em 1954
  • Membros de grupos étnicos russos: 58,5% da população
  • Membros de grupos étnicos ucranianos: 24,4% da população
  • Tártaros da Crimeia: 12,1% da população
Fonte: Censo da Ucrânia de 2001
Junto com os Estados Unidos, o Reino Unido e a França, a Rússia comprometeu-se a proteger a integridade territorial da Ucrânia em um documento assinado em 1994.
O presidente interino da Ucrânia, Oleksandr Turchynov, expressou preocupação com o que chamou de "série ameaça" separatista gerada pela deposição de Yanukovych.
A Rússia vem considerando essa deposição uma violenta tomada de poder pela oposição do país, enquanto a maioria dos países da União Europeia apóia a mudança de governo.
Segundo o jornalista da BBC presente em Simferopol, Daniel Sandford, a violência na cidade ilustra a complexidade da situação da região, que piorou diante do vácuo de poder.
"Os crimenianos russos temem que o novo governo em Kiev represente uma ameaça a seus laços com a Rússia", afirmou Sandford.
Já os tártaros apoiam em massa a mudança porque sua desconfiança da Rússia vem de longa data por terem sido os primeiros ocupantes da região. Eles sofreram uma invasão russa no século 18 e, nos anos 1940, acabaram expulsos da região por Stalin, só retornando à Crimeia nos anos 1990.

Unidades de elite

Em Kiev, o atual Ministro do Interior, Arsen Avakov, anunciou que as unidades de elite da polícia, conhecidas como Berkut, foram dissolvidas.
Ele disse que os policiais serão investigados e os que foram considerados responsáveis pela morte de manifestantes contra o antigo governo "serão punidos".
Essas unidades tinham entre 4.000 e 5.000 membros distribuídos pela Ucrânia.
Odiada por muitos no país, a Berkut é apenas uma parte das agências de segurança ucranianas, que há muito tempo são acusadas por grupos defensores dos direitos humanos e cidadãos da Ucrânia de cometer abusos contra os direitos humanos.
Ainda na quarta-feira, Turchynov anunciou que ele havia assumido o cargo de chefe das Forças Armadas.
O presidente Yanukovych fugiu de Kiev no final de semana e seu paradeiro ainda é desconhecido.
As autoridades interinas emitiram um mandado de prisão em seu nome e, na quinta-feira, o parlamento votou a favor do seu julgamento pelo Tribunal Penal Internacional em Haia.
O presidente fugitivo é acusado de estar por trás das mortes de mais de cem manifestantes pelas mãos da polícia de choque.

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