Ataque surpresa, em bloco e coordenado, amparado pelo isolamento de
ruas da região central, com auxílio de um helicóptero, e proibição de
circulação de pedestres. A mudança de estratégia da Polícia Militar de
São Paulo “atingiu o objetivo”, segundo avaliação própria, de evitar
ataque em massa de black blocs a prédios públicos e privados. Assim,
garantiu o maior número de pessoas detidas na capital paulista desde os
protestos de mês de junho – foram 230, encaminhadas a quatro delegacias
do centro e dos Jardins.
A
estratégia de impedir que os manifestantes se espalhassem pelo centro
também teve, pela pela primeira vez, a ação de um grupo de ao menos 100
PMs treinados em artes marciais para atuação específica em protestos. O
grupo foi batizado de “Tropa do Braço” e contou com PMs à paisana
infiltrados entre os manifestantes.
Ao contrário de manifestações
anteriores, os policiais também cercaram as possíveis rotas de fuga. No
quarteirão em que começou o confronto, a polícia fechou as duas saídas
da rua Xavier de Toledo, em frente à estação Anhangabaú do metrô e ao
Theatro Municipal de São Paulo. Assim, a maioria dos manifestantes
acabou cercada, sem chance de prosseguir em marcha.
Foto: Vagner Magalhães / Terra
Os
poucos que conseguiram escapar iniciaram um quebra-quebra nas ruas
Barão de Itapetininga e Sete de Abril, em direção à praça da República,
local de onde havia partido o protesto. Dos 230 detidos, a grande
maioria não trajava preto e não tinha o rosto encoberto por roupas
escuras – uma das características mais marcantes dos black blocs.
"Prenderam
um monte de gente e agora estão fazendo um sorteio de artigos do código
penal para o registro da ocorrência. Tem desacato, desobediência,
resistência e lesão corporal, já que uma policial teve o braço quebrado.
O problema é que não há a individualização das condutas. Entram todos
no mesmo saco", disse o advogado ativista André Zanardo, que esteve no
78º Distrito Policial, para onde foram levados 30 dos manifestantes.
“Não
sou black bloc, e no ônibus em que fui trazida à delegacia (1º Distrito
Policial, na Liberdade) não tinha nenhum black bloc. Revistaram a minha
bolsa e nela só havia meu celular, meus documentos, uma garrafinha
d’água e uma barra de cereal”, disse a estudante de Relações
Internacionais Nicole Morales Nunes, de 20 anos.
A estudante
conversou com o Terra ao ser liberada do DP – a exemplo de todos os 35
detidos encaminhados para lá em um ônibus da PM e também liberados. “Sou
totalmente contra a Copa; acho que o País não tem dinheiro para isso.
Mas o que me marcou nisso tudo foi ouvir um PM, dentro do ônibus,
falando que não tínhamos ‘direitos coisa nenhuma’”, disse.
“Fui
xingado de vagabundo várias vezes e humilhado quando tentei erguer
minhas calças – ouvi um PM me dizer que eu merecia era um cassetete. Não
sou black bloc e fui preso quando tentava defender minha namorada, mas
tenho minha ideologia e não acho que isso seja um crime”, afirmou o
estudante João Pedro Teodoro Estácio, 18 anos.
Skate, bandeira preta e próteses
Entre
os manifestantes, Vinícios Viotti, 18 anos, tentava se virar com seu
skate. Viotti conta não possui as duas pernas, desde que nasceu, mas
costuma frequentar as manifestações. As próteses, que costuma utilizar,
eram carregadas por um amigo.
O rapaz conta que no meio da
confusão sofre um pouco, mas que consegue se virar bem com o skate. "Os
policiais me xingam, ameaçam me levar preso, masn terminou tudo bem",
disseo rapaz, estudante de Gestão em Tecnologia da Informação. Outro
manifestante completou: "O Brasil pode não mudar, mas não vamos ficar na
fotografia dos covardes. Quem está bagunçando são os políticos".
Para comandante, ação da PM “atingiu objetivo”
Para
o comandante da operação durante o protesto, major Larry Saraiva, o
resultado da ação da PM “atingiu o objetivo”. “Porque nossa principal
meta era evitar depredações, e as pessoas foram presas. Os casos em que
houve de bancos quebrados, por exemplo, foram de grupos isolados”,
concluiu Saraiva. Durante o protesto, pelo menos duas agências do banco
Itaú tiveram as portas de vidro quebradas.
Na véspera do protesto,
durante apresentação de artefatos explosivos supostamente usados por
black blocs, o porta-voz da PM, capitão Emerson Massera, havia garantido
o “direito de livre manifestação da população” com a ação da Tropa do
Braço.
Entre os 35 detidos no 3º DP, por exemplo, nenhum portava
armas ou “objetos que garantissem a manutenção da prisão”, alegou o
delegado titular, José Sampaio Lopes Filho. Já no 4º DP (Consolação), um
funcionário informou que havia uma porção de drogas com dois dos
detidos –com os demais, dos 37 levados para lá, nada foi encontrado. No
87º Distrito Policial foram apreendidas pedras e um martelo com os 30
manifestantes.
PMs nos xingavam, diz fotógrafo
Entre
os detidos na rua Xavier de Toledo, estavam os repórteres Sérgio Roxo,
do jornal O Globo, Paulo Piza, do portal G1-SP, e Reynaldo Turollo
Júnior, do jornal Folha de S.Paulo. Além deles, estavam também dois
fotógrafos freelancers que tentavam registrar as prisões e as agressões
cometidas por policiais e por manifestantes. Um dos fotógrafos é Rodrigo
Zaim, 22 anos, que disse ter apanhado de cassetete durante a prisão e
ouvido xingamentos como “arrombado” proferidos por PMs.
“Eu estava
fotografando, e, de repente, começou uma correria. Os PMs cercaram o
grupo onde eu estava, formando um quadrado, e foram estreitando,
estreitando, e nos xingavam bastante. A palavra mais comum deles para
nós era ‘arrombado’. Vi quando um manifestante, já ajoelhado, foi
imobilizado por quatro dos policias ‘ninjas’ (da Tropa do Braço) –um
deles surgiu como um raio, de tão rápido”, declarou Zaim.
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