Um raro bate-boca em público explodiu nesta terça-feira entre a
Agência Central de Inteligência (CIA) e o Congresso americano, que
deveria, na verdade, monitorar seu trabalho, com o chefe da agência
negando categoricamente as acusações de espionagem sobre o Senado.
Hoje, a CIA voltou a ser centro de um escândalo político nos Estados
Unidos, acusada de violar a Constituição ao revistar os computadores de
vários senadores que investigavam um extinto programa secreto de
interrogatórios.
O diretor da CIA, John Brennan, rejeitou categoricamente as acusações
da presidente da Comissão de Inteligência do Senado, a senadora Dianne
Feinstein. Segundo ela, a agência revistou os computadores dos
investigadores do Senado para eliminar documentos ligados aos violentos
interrogatórios realizados durante a presidência de George W. Bush.
"Nada pode estar mais longe da verdade", frisou Brennan, em um evento
no Council on Foreign Relations, um prestigioso think tank americano.
"Não faríamos isso", garantiu, referindo-se ao objeto da denúncia.
Brennan também conversou com a rede NBC News: "a questão está sendo
administrada de uma maneira adequada, sendo vista pelas autoridades
certas, e os fatos virão à tona".
Os comentários de Brennan foram feitos pouco depois de Feinstein
iniciar um duro ataque público à CIA e denunciar no Senado as supostas
atividades da agência.
"Tenho sérias preocupações que a busca da CIA possa ter violado o
princípio de separação de poderes inscrito na Constituição americana,
incluindo a liberdade de expressão e de debate", declarou Feinstein, em
plenária no Senado.
"Pode ter violado o marco constitucional vital para uma supervisão
eficaz por parte do Congresso das atividades de Inteligência, ou
qualquer outra função governamental", acrescentou.
"Solicitei desculpas e um reconhecimento de que essa busca da CIA nos
computadores (...) era inadequada", disse Dianne, acrescentando que
"não recebi nenhum dos dois".
O discurso de Feinstein representou uma pausa em suas relações
normalmente cordiais com a comunidade de Inteligência, a qual defendeu
em diferentes ocasiões.
As declarações da senadora foram motivadas pelas denúncias de
autoridades não identificadas à imprensa. Segundo essas fontes não
reveladas, funcionários do Congresso teriam levado documentos sigilosos
sem a devida autoridade para fazê-lo, o que deflagrou a investigação.
Feinstein rejeitou as acusações.
Na Casa Branca, o porta-voz do presidente Barack Obama, Jay Carney,
desconversou, afirmando que o caso é alvo de investigação de um
inspetor-geral independente da CIA e foi encaminhado para o Departamento
de Justiça.
"Não posso comentar sobre alegações que estão sob análise", afirmou.
Carney disse que a Casa Branca leva as preocupações de Feinstein muito a sério, mas também tem plena confiança em Brennan.
- Documentos desaparecidos -
O caso remonta a vários anos. Em 2009, a Comissão de Inteligência
iniciou uma investigação sobre o programa de interrogatórios violentos
da CIA, incluindo a técnica chamada "submarino". Bastante polêmica, a
prática que simula um afogamento foi usada nos dois mandatos de George
W. Bush (2001-2009).
Investigadores da comissão foram habilitados com acesso a um prédio
de alta segurança, na Virgínia, próximo de Washington, e a mais de 6
milhões de documentos entregues pela CIA. Segundo um acordo entre o
Senado e a agência, eles poderiam fazer a consulta em computadores
protegidos, aos quais a CIA não deveria ter acesso.
Em 2010, mais de 900 páginas com documentos particularmente
importantes desapareceram dos memorandos protegidos dos investigadores,
relatou Feinstein. A senadora contou que, depois de reclamar com a Casa
Branca, os documentos foram fornecidos novamente.
Em dezembro de 2012, a Comissão aprovou, a portas fechadas, um
relatório devastador de mais de 6.300 páginas chamado "Informe sobre a
tortura". No documento, os investigadores concluíram que a técnica foi
um "terrível erro" e não contribuiu para seguir a pista de Osama bin
Laden.
Entre os documentos "sensíveis" desaparecidos havia alguns referentes
a um memorando secreto divulgado pelo diretor anterior da CIA Leon
Panetta. Segundo a comissão, o texto contradizia a posição oficial da
CIA sobre os interrogatórios.
"Em 15 de janeiro de 2014, o diretor da CIA, (John) Brennan, pediu
uma reunião de emergência para me informar (...) que, sem notificação
prévia, ou aprovação, o pessoal da CIA esteve bisbilhotando - essas
foram as palavras de Brennan - os computadores da Comissão no prédio
externo", contou a senadora, explicando que a operação compreendia os
discos rígidos que continuam o trabalho interno da comissão e sua
comunicação interna.
O inspetor-geral da CIA transmitiu o caso ao Departamento americano
da Justiça, um movimento que Feinstein descreveu como "um esforço
potencial para intimidar" seus funcionários.
De acordo com a senadora, o relatório sobre a tortura poderá ser
"desclassificado" parcialmente este mês, depois da autorização da Casa
Branca.
A organização American Civil Liberties Union aplaudiu Feinstein por
sua "necessária e histórica defesa do princípio constitucional de
separação de Poderes".
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